sábado, 24 de outubro de 2015

Choro, chuva que lava e alivia



Nascemos chorando, pela saída do útero, pela luz revelada, por ganharmos a vida. Em nossos primeiros anos, chorar era a melhor forma de revelar e conhecer nossas emoções. Mas envelhecemos valorizando somente o riso na busca pela felicidade, sem nos darmos conta de como o choro é essencial. Por dor e tristeza, alegria e beleza.

Como chuva torrencial de verão, que chega para lavar a alma e aliviar o peito, chorar pode retirar de nossos ombros um peso injusto que carregamos sem saber o porquê. Feito milagres ou conquistas do tempo, pensamentos clareiam espessas nuvens de sentimentos e o choro – como água redentora do céu – termina por dissipá-las. Assim escoam-se culpas, mágoas e desilusões.

Por um sofrimento, um revés ou um enternecimento de vivências e lembranças, chorar não nos faz fracos. Ao contrário, pode nos fortalecer ao nos tornar íntimos de nós, nossos melhores acalentadores. Mesmo solitário, sobre o travesseiro ou sob o chuveiro, o choro nos deixa aceitar o que passou e entender o que ficou, para aguardarmos o que virá com o espírito desanuviado.

Choros são mares tranquilos ou revoltos em que navegamos. Às vezes podem vir em tsunamis avassaladores, transbordando em olhos já cegos por desespero ou desesperança. Nesse caso, é preciso ter cuidado, pois somente pedir resgate ou agarrar-se a algo sólido fará emergir, voltar à terra firme e sobreviver ao naufrágio.

Penso que ficamos mais propensos às lágrimas comovidas na maturidade. Os anos parecem nos fragilizar diante da finitude da vida, mas no fundo alargam a nossa sensibilidade e o nosso sexto sentido em relação ao que verdadeiramente nos toca e nos choca no mundo. Talvez porque estejamos mais perto de Deus.

Sempre fui ´chorona`, apesar de adorar dar boas gargalhadas. Jovem, chorei por medos, decepções e tolas inseguranças. Depois passaram a ser as perdas, os hormônios ou os sentimentos caros a desaguar. Várias lágrimas já brotaram enquanto eu escrevia (ironicamente não esta crônica). Foram gotas serenas, emocionadas, como as de esperados reencontros.

Choramos por amor, solidão, conquistas, perdas... Choramos com os nascimentos dos filhos, com as mortes de pessoas queridas, nas chegadas e partidas. Se os olhos brilham úmidos, por que travar a emoção e deixá-los secos, turvos?  O choro é a expressão da dor de viver, mas também de seu mistério e encanto. Como o orvalho nas flores, os pingos de chuva em janelas ou a tempestade de raios que assusta e depois refresca, limpando o céu e trazendo de surpresa um lindo arco-íris.


 


Texto e fotos: Nadja Bereicoa

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