A adaptação a outro país pode ser lenta e difícil (pelo menos eu, que sequer havia morado fora de minha cidade, a senti assim) mas é transformadora, uma terapia intensiva que a vida nos impinge. Cada dia, cada semana, cada mês significam uma etapa vencida, uma organização feita, uma mudança posta em prática. Entramos em choque não somente com a cultura local, mas também com o nosso modo de ver as pessoas e os fatos. Esbarramos com nossos preconceitos, driblamos nossos medos, adquirimos novos hábitos, ajustamos nossas expectativas.
O primeiro
passo para adaptar-se é encarar, literalmente, o vazio. E isso começa antes da partida. Fazemos uma faxina espiritual, nos desfazendo
de coisas, revendo fotos e desengavetando sonhos. Deixamos para trás amigos, familiares e casa
e embalamos nosso passado junto com pertences. Colocamos partes deles na
memória, outras em malas no avião e em containers de um navio a chegar três
meses depois. Até que um dia nos vemos sentados em uma caixa de papelão,
observando a amplitude de uma casa que não consideramos como lar, do outro lado
do mundo. Tendo que sobreviver, aprendemos a improvisar e a ter paciência para esperar,
juntar pedaços e refazer a vida.
Meu baque inicial foi forte. De escaldantes
40 graus cheguei num frio de 2 graus e com 4 horas a menos no relógio, o que me causou um grande cansaço físico e mental. Vivia uma
euforia de turista quando meu pai faleceu sete dias após a minha chegada, me
fazendo pular logo às fases da negação e do isolamento, com saídas esporádicas
para supermercado, levar os filhos à escola e lazer nos fins de semana. Fiz da
casa que alugamos o meu casulo, um território onde as fronteiras que precisava
romper eram a tristeza e o medo. Ali reavivei memórias e fortaleci a união com minha
família - no mesmo barco, viramos todos nau e porto.
Comparei
tudo nos primeiros dois meses: costumes, comidas, lugares, com a saudade falando a
favor de minhas raízes. De cara, no Carnaval, senti falta da alegria, bom-humor e descontração
dos brasileiros. Me surpreendi, porém, com a simpatia dos norte-americanos, taxados de soberbos e formais mas que, no caso dos texanos, se revelaram acolhedores e gentis. As boas-vindas de sorridentes vizinhos,
oferecendo cookies, bolos e ajuda, trouxeram aconchego e a certeza de que os estereótipos nada nos acrescentam. Uma das características que logo passei a admirar e assimilar - com certo sacrifício - foi o lema "Do It Yourself" para as tarefas domésticas. É assustador e ao mesmo tempo libertador.
Percebi que de fato estava me adaptando ao me matricular num curso de inglês, com pessoas de cerca de vinte países - certamente uma crônica à parte. Um mundo inteiro se revelou para mim numa sala de aula, tão vasto e tão único, tão cheio de contrastes e semelhanças. Com sotaques e experiências próprias, temos em comum o sentimento de pertencer a outro lugar mas querer estar felizes aonde for possível. Somos expatriados, imigrantes e até refugiados, à procura de conhecimento, trabalho ou, simplesmente, paz. Ainda que às vezes determinadas palavras sejam intraduzíveis – “I miss”, por exemplo, não dá conta de “tenho saudade”...-, os sentimentos têm uma só linguagem: da alma.
Percebi que de fato estava me adaptando ao me matricular num curso de inglês, com pessoas de cerca de vinte países - certamente uma crônica à parte. Um mundo inteiro se revelou para mim numa sala de aula, tão vasto e tão único, tão cheio de contrastes e semelhanças. Com sotaques e experiências próprias, temos em comum o sentimento de pertencer a outro lugar mas querer estar felizes aonde for possível. Somos expatriados, imigrantes e até refugiados, à procura de conhecimento, trabalho ou, simplesmente, paz. Ainda que às vezes determinadas palavras sejam intraduzíveis – “I miss”, por exemplo, não dá conta de “tenho saudade”...-, os sentimentos têm uma só linguagem: da alma.
Estar longe do
meu país às vezes dói e, confesso, sintonizar a TV nos telejornais, programas e novelas brasileiros
me conforta, reafirma minha identidade. Mais do que nunca, vejo que a vida é uma
constante adaptação a pessoas e situações temporárias ou definitivas que queremos ou precisamos para ser felizes. Isso não significa romper com quem somos ou o que
acreditamos. Pode implicar em grandes
mudanças ou pequenos ajustes, mas principalmente em procurar o entendimento e a tolerância. Para isso, um
olhar estrangeiro, de quem estranha mas quer aprender e aproveitar a viagem, é sempre bem-vindo.
Texto e fotos: Nadja Bereicoa
Texto e fotos: Nadja Bereicoa
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